Pessoa: Estava pensando o quanto minha vida está ruim. Vez e outra lembrava de que talvez o que eu estivesse sentindo era ingratidão a Deus e a tudo, mas logo isso era rebatido pelo argumento de que eu não deveria me conformar simplesmente.
Alguém: Eu só lembrava queria chegar logo em casa, mas o trânsito estava muito mais lento, como agora já é costume. Ainda bem que já estava sentada, na janela e com um livro à mão.
Talvez: Vou pegar este ônibus.
Pessoa: A coisa estava feia, eu estava em pé no ônibus, indo pra casa. No entanto, querendo curtir o final de semana, mas como uma pessoa independente e não dependente dos pais, como ainda sou. "Desgraça!" eu praguejava internamente.
Talvez: Quero entrar e o dinheiro está aqui.
Pessoa: De repente um morador de rua- como se a rua fosse lugar de morar- tentava entrar no ônibus. Pobre senhor, e tinha idade pra ser meu avô. O motorista não entendia que o idoso queria passar pela roleta em vez de entrar pela porta de trás. Ele tinha dinheiro, amassado e sujo, mas tinha.
Alguém: Nossa! Como fedia aquele homem!Coitado! O rapaz ao meu lado levantou. Fiquem sem saber se ele realmente descera do ônibus ou se ajudou a compôr a aglomeração de assustados e enojados que se formava na parte traseira do ônibus.
Pessoa: Ham! Aí um nojentinho rapidamente se levantou e foi pra parte de trás ônibus. Quando vi, lá eu sozinha, em pé na parte da frente. Sentei no lugar do nojentinho, mas não parava de olhar pr'aquele senhor. Diante dele me sentia a menor pessoa do mundo, por ser tão ingrata!
Talvez: Entrei e tem um banco.
Alguém: Bem, e então pelo menos uma menina sentou ao meu lado em vez dele, mas o cheiro dele empesteou todo o lugar e não adiantava abrir as janelas. Aí eu vi que a menina começou a chorar. Coisa estranha! Mas deve ter ficado comovida com a situação daquele coitado!
Talvez: E essa menina me olhando.
Pessoa: Que ridículo eu ali chorando na frente dos outros. Tentava ser discreta, com medo de pensarem que eu estava nojo daquele senhor. A roupa dele estava suja de sangue, que provavelmente pingara das feridas em seu nariz. E eu chorava mesmo era por pena de mim, miserável. Sou mais miserável do que aquele mendigo!
Alguém: Já não estava conseguindo aguentar aquele cheiro! Aí, aquela gente que se espremeu toda lá atrás começou a fazer barulho.
Indigentes: MOTORISTA! EXPULSA ESSE HOMEM DAQUI! TÁ FEDENDO MUITO!
Pessoa: E o cheiro de excremento cru me lembrava de como sou ingrata e impotente! Eu queria ajudá-lo, mas o que eu podia fazer?! Não tenho nada que possa ajudá-lo o suficiente.
Alguém: Então, além do cheiro, tinha a gritaria daquela gente toda, o trânsito e a menina chorando. Ficou um caos e não conseguia mais ler o livro.
Talvez: Vou levantar.
Pessoa: E por que ele deve ser expulso do ônibus?!
Indigentes: Ele está fedendo muito e atrapalhando nosso direito de ir e vir.
Pessoa: Pois então, ele também tem o direito de ir e vir. Também pagou a passagem como todos. Ele está fedendo, mas está aqui. As pessoas fedem e pronto!
Indigentes: Isso está muito errado! Temos o direito de não sentir esse cheiro. Vamos vomitar!
Pessoa: Ele podia ser pai de um de nós! Avô! Ele é uma pessoa com direitos! Estou sentindo o mesmo cheiro, mas ele tem direito de ficar.
Alguém: Deixa pra lá, minha filha! Por dentro, essa gente fede mais do que esse homem.
Pessoa: Naquela momento ninguém percebeu que ele já havia saído. Será que o cheiro dele ficou ou todos nós passamos a sentir o nosso próprio odor?
Oi Ju! Bom texto. Parabéns! Beijos :)
ResponderExcluirme lembro quando voce chegou em casa comentando o fato ocorrido.
ResponderExcluirvoce é muito especial pra mim. minha admiração por você vai além da maternidade